Reforma do governo Bolsonaro promete contribuição de verbas remuneratórias como Vale-Refeição, Vale-Alimentação e outros. Assim como amplia cobrança da alíquota previdenciária a verbas de qualquer natureza, inclusive participação nos lucros.
A Reforma da Previdência do governo Bolsonaro também cria alíquotas de recolhimento para o INSS sobre rendimentos “de qualquer natureza”. Como resultado, abre-se uma brecha para aplicar desconto de INSS sobre Vale-Refeição, Vale-Alimentação e outros itens remuneratórios. Também promete reduzir valor do benefício em alguns casos em quase 50%.
Atualmente, só pode incidir contribuição previdenciária sobre o que repercutir na aposentadoria, em tese, o salário. “Os primeiros 15 dias de auxílio-doença, 1/3 de férias, 13º salário e outras rubricas não incidem na aposentadoria. Todavia, não pode haver contribuição previdenciária”, explica Guilherme Portanova, advogado da Federação das Associações dos Aposentados e Pensionistas do RJ (Faaperj). “A PEC 6 diz que incide sobre verbas de qualquer natureza, abre-se uma brecha para uma interpretação dúbia”, complementa.
O impacto sobre o salário do trabalhador da ativa é outro fator, defende João Badari. Ele acrescenta que aja uma discussão sobre taxação dessas verbas para fins de arrecadação previdenciária. Como resultado, os tribunais têm entendido que o desconto aplicado pelas empresas não devam entrar na base do salário. Todavia, com a PEC 6, o que poderia ser questionado na Justiça passa a ser lei.
Lei prevê exceções para o desconto do INSS
Atualmente, a Lei 8.212/1991 determina as regras de contribuição para o Regime Geral da Previdência Social (RGPS). Além disso, prevê exceções de pagamentos que não integram o salário do trabalhador. Dessa forma, significa a exclusão dos valores no cálculo da contribuição sobre a folha de pagamentos pelas empresas.
“Seria o caso do auxílio alimentação ou indenizações por prejuízos sofridos pelo empregado na prestação de um serviço”, afirma Badari.
“Na prática, por causa do Artigo 195 muitos pontos da Lei 8.212 passariam a ser inconstitucionais. Em função das alterações promovidas pela PEC a própria Constituição determinaria a aplicação da legislação de uma forma diferente”, explica.
Paga empregado, paga empregador, sofre o comércio
Um ponto destacado pelos especialistas é que esse aumento na base de incidência da alíquota do INSS afeta trabalhadores e empregadores. João Badari explica que um trabalhador que receba R$ 2 mil de salário e mais R$ 400 de vale-refeição, por exemplo, tem a base do seu salário-contribuição feita sobre R$ 2 mil. “Mas com a reforma esses R$ 400 do tíquete também vão entrar no cálculo, mesmo que sejam pagos em cartão magnético”, acrescenta.
Já a advogada Jeanne Vargas, do escritório Vargas e Navarro Advogados Associados, chama atenção para a questão dos empregadores. “Esse aumento da base de incidência da alíquota alcança diretamente o empregador, que poderá reduzir o valor de benefícios como o vale-refeição, o vale-alimentação, para compensar o aumento do tributo”, avalia Jeanne.
E essa possível diminuição de valores, tanto no tíquete quanto no salário, pode afetar uma outra ponta: o comércio.
“Com menos dinheiro, as pessoas buscam por outras opções na hora de se alimentar. Podem mudar de restaurante e começar a levar comida de casa”, diz.
E em um universo com mais de 13 milhões de desempregados, segundo levantamento do IBGE, o poder de barganha do empregado pode ficar comprometido. E é aí que mora o problema, segundo Marcellus Amorim, advogado trabalhista.
“Algumas categorias são mais fortes, têm sindicato representativo, portanto poder de barganha. Já quem não tem representatividade vai acabar se sujeitando a salários menores e benefícios parcos”, alerta Marcellus Amorim.
“Ter emprego hoje em dia já é uma loteria, manter as contribuições em dia, ficará ainda mais difícil”, finaliza o advogado trabalhista.
Para Receita, taxa não incide em benefício indireto
De acordo com a própria Receita Federal, atualmente não incide contribuição previdenciária sobre vale-alimentação. Em uma solução de consulta, a Receita alterou seu entendimento sobre a taxação da contribuição previdenciária sobre o auxílio-alimentação. De acordo com o Fisco, quando o auxílio for pago ‘in natura’ ou por meio de tíquete ou vale, não há cobrança de contribuição previdenciária para o trabalhador.
Em dezembro de 2018, em outra solução de consulta, a Receita afirmava que havia incidência de contribuição previdenciárias sobre o auxílio-alimentação, não importando a forma de pagamento.
Ao destacar a importância da última decisão, o tributarista Fábio Calcini lembra que a jurisprudência no caso dos tíquetes não era favorável ao contribuinte, havendo diversas decisões da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), mantendo a incidência da contribuição.
“Essa alteração reconhecida pela solução de consulta é uma evolução importante, até porque a alimentação fornecida, de certo modo, não deixa de ser um meio para a execução do trabalho. Não chega a ser, na minha visão, efetivo benefício a ser considerado salário indireto.”
Fonte: Jornal Contábil